Carta à Halina
Olhier
Queria ter te
escrito um poema. Uma poesia. Mas perdoe-me a intimidade, sinto um espaço fluído
entre nós, quase deslizante. É raro sentir isso, pois que optei por
uma carta. Além do recesso – espero – temporário de inspiração.
É provável que
aqui você encontre espectros de poesia ou halos enormes de
reconhecimento e consideração, o que por si só já é poesia, mas
a palavra, esta flui sempre como uma conversa debaixo de árvore. E
temos entre nós, um respeitável momento de silêncio. Mais pra
frente quero te contar sobre o silêncio. Outra coisa rara.
Tenho sentido um
sufoco enorme. Por abraçar tanto as pessoas, todas, quase perdi o
dom dos braços. E é sempre bom ter com quem sofre tão nuvem, tão
brisa, tão vento que não sufoca. Seu ego não veste botas, mas asas. E só é assim, por sua puríssima
honestidade. Outra coisa rara. Honestidade esta, sem desespero,
apesar dos pesares. É como se você respeitasse o sofrer do outro
sem saber do que se trata e nem se se trata maior que o seu. Sabe
o quão grande é isso? É enorme.
Bukowski
já havia dito que as pessoas o esvaziavam. Senti esvair de mim, a
mim. Mesmo segurando o peito, derramei. Sei lá onde fui parar… Por
isto, inventei bifurcações. Era preciso partir sem fazer o caminho
contrário, sabe? Só ir sem desprezo, mas com algum desencantamento. Há tanto desespero no mundo, Halina, tanto! Que eu não
podia mais ser cúmplice de aflições estendidas e engessadas e
escolhidas. Daí eu vejo você lutando. E é tão bonito! Sabe-se lá,
Halina, de você… Sabe-se lá! Mas você escolhe ler, você escolhe
encher a tua vida de arte e de glória. Você escolhe amar. Todas as
dúzias de pássaros que imagino te voam. E te dançam e te
agradecem. Você poderia ter escolhido nos desesperar a todos ou nos
fazer conformar com tudo, mas não.
Sobre o silêncio,
me perdoe a ausência da bibliografia, eu leio demais. Leio, de placas publicitárias a serviços de compra de ouro e prata e implante dentário. Mas, sobre o que eu
gostaria de te contar sobre o silêncio, diz respeito ao pensamento.
É o que ficou em mim, basicamente. Penrose, o físico, caminhava com
algumas pessoas pela rua. E é claro que iam dissertando sobre muitas
coisas, como todos fazemos em conjunto. Em dado momento, precisaram atravessar a rua e então
fizeram aquele silêncio característico que fazemos ao atravessar
uma rua. Foi ali, exatamente ali, que ele concebeu a teoria dos
buracos negros. Num pequeno momento de silêncio. Mas, retomado o
“conversê”, ele se esqueceu do que havia pensado. E só retomou o seu pensamento, momentos mais tarde, ao se lembrar do silêncio que
fazemos ao atravessar uma rua.
Halina, agradeço pelos
momentos de compreensão silenciosa dos meus momentos de confusão e os hiatos, sem nenhuma cobrança destes novos tempos. Momentos meus, que são em
verdade e puramente, nada mais que, cabeça na lua.
Acredito que nesses momentos, estamos parindo algo muito importante.
Um abraço muito apertado, foi bom demais te conhecer,
Zi.