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Aqui a poesia é amadora. A música e a fotografia, amadoras. Tudo dentro deste peito é amador.

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terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Carta atrasada a Bernardo Oliveira, ou como dizemos, a quem interessar possa.

“Como assim você sofre de atrasos?”
E, todos os verbos se enfileiraram, expectados, aos pés do meu vazio de explicar. Ele também.
Depois de algum silêncio, (por que eu ainda não deixo que o silêncio exista?), arrisco, agora que tudo é, eu não sou mais. E isto é sempre.
Ele suspira como quem tenta entender se há muito tempo dentro de pouco espaço ou o contrário. Há muito dele em ser agora e pouco eu sendo. “Isto não é atraso, mas uma espécie de adiantamento com atrasos no final.” É quase confortável pensar que ele tenha certa razão, confesso. Não demora e eu aponto o imenso dicionário naufragado na estante e inflexiono uma cara de “para quê?”. São tantas as palavras e, nenhuma, de fato, serve. Uma ou outra apertam demais. Algumas pinicam de forma que só saindo delas. Mas as piores são as que não consigo estar. São enormes. Procuro o buraco das mãos, da cabeça, caber justo, não acontece. Mas penso em árvore e fico nela por muito tempo.
Então digo, e não sei depois de quanto tempo…
Contam que, Vincent van Gogh, ao ser questionado sobre certa maluquice em pintar árvores tão altas que iam além das estrelas, estas, que estão a milhões de anos-luz das árvores, um absurdo, sorrindo respondeu que as árvores são o anseio da terra para transcender as estrelas. “Estou pintando anseios, não as árvores.” Seria este o meu atraso em relação ao chão? Do que é, em relação ao que queria que fosse e que, arquitetonicamente, e tão ainda mais inconsciente é buscado, como com os arranha-céus?
Ele sacode a cabeça confuso, e com uma paciência paternal, reabastece nossos copos e me diz, muito amorosamente: “Você nunca se foi de fato, embora se lance o tempo todo. E muito emboramente esteja sem estar". Ele ri do “emboramente”, já sabendo que eu ia gostar.




Ah, se eu não fosse tão atrasada de adiantamentos… Tentei me fazer alcançar mas eu era longe. Eu juro.