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Aqui a poesia é amadora. A música e a fotografia, amadoras. Tudo dentro deste peito é amador.

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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Relato livre


2010 foi o 'maior' e mais longo ano da minha vida. O mais pesado e o mais leve ao mesmo tempo. Apostei alto em tudo! Perdi fortunas em esperanças. Estiquei e encolhi. Ganhei força e outras esperanças novas. Algo grandioso veio morar aqui dentro, isso sinto! Muitas vezes me senti cansada e abatida mas aprender coisas importantes me desacelerou. Entre elas e a maior, foi dar conta de que não posso mudar o mundo, mas posso mudar as coisas ao meu redor e cuidando de um canto, fiz muito. Saindo do meu 'quintal' fui correr demoradamente meus olhos pelos olhos de minha mãe e meu pai, lhes contando as rugas, cabelos brancos e ouvindo pacientemente suas histórias. Baixando consideravelmente o volume ensurdecedor das coisas ditas urgentes e que só acabam por nos desviar do amor. Me lembro de num momento assim ter pensando que doar o olhar é a melhor maneira de receber. Passeei pelas doces veredas da abnegação dos meus amigos, que não soltaram da minha mão nos momentos mais frios. Enxerguei de uma forma muito generosa a beleza escondida em cada um deles. Sou grata!
Desisti de muitas coisas sim, algumas bem caras. Desistir nunca foi uma palavra atraente pra mim, mas em alguns casos o recheio foi de pura aceitação. Um dia eu escrevi: não desisti, concordei!
Hoje paro e rio da maneira brilhante com que a dor ralhou comigo e eu gritava com ela: Por que comigo? E ela - Por que não com você?
Mudei um jeito velho que eu tinha. Palavreei até gastar as pontas do dedos... Minha mãe até pensa que sou poeta, graças a solidão! A palavra essa pílula diária e milagrosa. Hoje vejo mais passarinhos que antes e sinto que perdi foi tempo já que eles sempre estiveram no céu.
De certo que perdi o gosto por multidões. Não consigo mais entreter-me com o direito das pessoas. Prefiro o avesso. 
Este ano foi o que mais me lembrei de minha saudosa avó, mesmo depois de mais de 10 anos de sua explendorosa passagem. Dona Xica e suas coisas sabidas. Ela era pobre que só, mas de imediatismos e desnecessidades. Por ela, não corro mais. Viver não dói!
Levo na sacola, pela primeira vez em tempos, um saldo realmente positivo. Pelo qual posso resumir em uma frase, que me acompanhou por quase todo ano: Perdoo tudo por preguiça de carregar peso!

Cá comigo, ando crescida!

~º~

'Tempo, tempo mano velho, falta um tanto ainda eu sei

Pra você correr macio

Como zune um novo sedã.'




Pato fu




~º~

Á todos que vieram me visitar o ano todo, um Feliz Natal!
E um 2011 sorteado, sortido… mais divertido. Leve, levado, límpido. Amoroso, simples e sonhado! Tudo multiplicado, que tudo que ganhares vire presente a ser presenteado. Um sorriso – gargalhada, uma paz – paraíso, lágrimas – banho de chuva!
Abraço de rachar mágoas, beijos estalados!



quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Narciso deslumbrado




O céu é um mar que não tem fundo.
No mar nasce sol e deita lua. 
Quando um anoitece o outro flutua.
Os peixes só dormem quando o azul do mar desdoura...
No mar também tem estrelas mas quem brilha são os plânctons...
No céu os passarinhos não aceitam iscas.
E borboleta no fundo do mar voaria!
O avião é um tubarão com asas.
O céu enxerga no mar sua imagem artificada e  
na terra os homens a chamam de Monet.
Não necessita guarda-chuva os que de água tem superfície.
As nuvens são marés por onde o tempo passa. 
Mas quando o céu tá limpo dá pra pescar muitos sonhos...
  

Imagem/obra:  Sunset de Monet

~º~

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Margarida


A mãe perguntou-me orgulhosa - agora cê é poeta fia? - Respondi que não. - A palavra, esta me apazigua. Eu, sou apenas a filha única da Margarida.
Ela achou pouco. 
Margarida passou a vida bordando uma cortina de perguntas e só aprendeu os macetes do perdão depois que eu aprontei nela mil enfeites de malcriação. Ou quando suas roupas encardidas de mágoa fugiam de rabeira no vento, enquanto eu gracejava com seus pregadores. Ou quando eu dizia que as flores são apenas perguntas que a terra faz para o nosso olhar distraído. Ou quando, para desafiar sua vaidade, eu contava que seu nome era uma das palavras preferidas dos compositores. 
Porque será que ela não me deu nome de flor? Eu talvez gostasse de me chamar Camélia ou Jasmim. Mas farto-me em ser apenas a filha única da Margarida, aquela que capinou canteiros inteiros nas veredas de sua alma. Aquela que perguntava aos cantos seus porquês e agora pensa que eu sou poeta e anda por aí com ares que me decifrou... Aquela que pouco floriu. Mas hoje ostenta primaveras o ano todo. Que me importa então o que pensam de mim? Se sou bem pouco suficiente para as expectativas, se causo preguiças com minhas coisinhas ou se não sou moça fácil de se tratar? Depois de hoje, Margarida nasceu de mim, eu parí uma flor enfim. Porque ela descobriu algo novo. E essa é a vida que ela sempre esperou saber. Que as minhas abstrações eram apenas traquinagens vestidas de versinhos que eu insistia em lançar ao ar, mas alcançavam seu coração com o poder que só uma mãe tem sobre uma filha.

Ela achou muito!




Eu vou partir, 
pra cidade garantida, proibida.
 Arranjar meio de vida, Margarida... 
Pra você gostar de mim...

E essas feridas da vida Margarida. 
E essas feridas da vida, amarga vida... 
Pra você gostar de mim. 'Vital Farias'

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Óculos de leitura




    Porque eu tive que repousar os olhos sobre um papel amarelado, coberto por garranchos, imaginando o quanto uma carta assim poderia revelar sobre quem a escreveu. Frases ébrias espatifadas por linhas invisíveis de emoção. E eu dependurada por uma letra, entre a linha que foi lida e a que foi rasgada. Um momento de silêncio incolor. Nesse caso me foi preciso mais que rodopiar os olhos por elas, foi preciso entender quantas emoções ainda poderiam ser captadas por uma sílaba que usa chapéu, como se fossem ainda mais, duas sobrancelhas tristonhas repousadas sobre a ausência e a distância. Mais que isso, eu precisava entrar em profunda intimidade com elas, deslizar minhas lentes de aumento pelos parágrafos, pincelando algumas carícias com os cílios. Já que um importante pedaço meu, estaria alí capitulado.

Talvez não à toa, a carta tenha se iniciado com uma crase suspensa sobre a letra que se antecipava a mim, como uma chuvinha do oeste prestes encharcar o papel, espalhando letras sobre os pensamentos. Em dados momentos até que era fácil imaginar o til como um sentimento etéreo, balbuciando em cima da palavra coração. Precisei olhar pela janela e verificar que o mundo continuava no mesmo lugar, enquanto vírgulas se fingiam de folhas batidas pelo vento, explicando a árvore. Meu coração roncava dentro do peito, me inspirando fraquezas de entender. Quantas das interrogações dispostas alí seriam apenas filhas imaturas, grávidas de inquietações? Uma frase tão esperada que desmaiava em reticências, feito estátuas de areia desfazendo-se com o vento... Ainda preferi acreditar que estava presa a alguma espécie de truque de pontuação, propositalmente aplicado para que eu pudesse repousar sentidos compartilhados de profunda exclamação ao final dos relatos. 
E talvez e não à toa também, tenhamos terminado, nós três em ponto final. Uma pedra no caminho. Ao menos para que pudéssemos juntas descobrir uma maneira de recapitular rabiscando novos caminhos...
Minha alma ao abandonar a tal valsa fluída, voltava ao corpo enquanto o ônibus fazia parada no meu ponto de descer...

 Haveria de ser assim, como na vida!


Imagem, Amanda Cass



quarta-feira, 20 de outubro de 2010

do perdão




Tentei deitar os olhos por mais noites seguidas do que eu pude contar. Mas parece mesmo que eles tinham muito mais a fazer, como ficar dando visão aos pensamentos muito bem acordados de uma cachola ressabiada. 
Precisei me juntar a eles para não ficar sozinha na cama. Só o coração implorava um sono eterno, mesmo sob o hipnótico efeito de fé que o tercinho azul operava ao balançar por entre meus dedos, enquanto eu mirabolava um perdão além das possibilidades.
Precisávamos salvar vidas ainda naquela noite ou então tudo teria sido em vão. Por algum motivo, que não desprezo, a mente daquele moço ficara no automático de suas fraquezas enquanto ele estava... não sei onde. E por isso, tomei a raiva por impulso, como um análgésico que decidi por não administrar a cartela toda. Afinal, o moço não só se perdera como não havia conseguido ainda se encontrar. Compreender sua consumição era como estender nuanças mais leves pelos dias. Coisas das quais me sobram no olhar. E escrever foi apenas a menor distância que encontrei para abraçar. Quem sabe que eu assim, consiga lançá-lo à um mergulho desatado para dentro de si. E eu seria feliz. Ainda mais, se  puder um dia ensinar aos meus filhos, onde fica abrigada a alma. Não quero mais correr o risco de esbarrar numa ausência assim tão funda. Uma herança de respiros valiosos. 
Mas na verdade eu só precisava dizer ao moço, que tivemos as vontades bifurcadas a medida que nos aproximávamos do espelho. E que por isso, agora somos apenas e muito, a moça e seus sonhos, o moço e seus caminhos, mas com tons e força diferentes. Precisava dizer que essas eram as únicas chaves que eu possuía para abrir todas as gaiolas das quais criamos. Viver não precisava doer. Mas eu precisei. Como preciso dizer, que foi assim que gastei as dores todas, uma a uma nas contas daquele tercinho azul de rezar. 








'Tudo, aliás, é a ponta de um mistério, inclusive os fatos.'
 Guimarães Rosa




Imagem, Amanda Cass

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Sem adulto vigiando...




"Por que você não cresce menina?".

É o grito implacável do tempo a incomodar nas minhas orelhas. Só sei franzir a testa e continuar fazendo o que estava tão deliciosamente tramando. Carinhos num cartão, desenhos com borrão. E a vida pintada para fora do risco, às vezes chinelo, às vezes não...  Faço escondida do patrão, com medo do ladrão que leva o instante embora... Medo de me deixar amontoada num cantinho desse corpo espichado pelos anos. Se é sempre tempo de sonhar mais alto, se o céu sempre arruma condição pra vôo, por que não? E do tempo, faço as pazes com ele também.
 Eu ainda me vejo pequenina, alvorossada, batendo os pézinhos, a cada vez que ameaço o seu futuro colorido, de cantora, médica ou atriz. Por ela, sempre arrumo tempo de voltar a perguntar. Estou de castigo hoje? Que eu fiz? Você me perdoa? Podemos brincar agora? Vamos desenhar um coração?



Pelo dia das crianças e por todas as crianças que estão de castigo, por todas as outras que só precisam ser chamadas no portão, eu chamo.




Volta que esse mundo só precisa de você.
 (...)
 Não fique ai enterrada,  vem para a rua...
 - Cordel do fogo encantado



A imagem, novamente, é da brilhante Amanda Cass



quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Menino saudade







Leonardo é quase saudade. Penso que talvez ele até a tenha inventado com suas ferramentinhas de cativar e já que também a palavra não possui equivalente em outras línguas. Penso eu...
Embora ele imagine ser apenas um regador dela, só mudou o sentido para modo de não assustar tanto. Foi o que fez, polarizando saudades no trilheiro que dá para o meu quintal, onde nascem pés de nao-vejo-a-hora e volte-logo. E como ele gosta de vir regar, eu deixo. Dizem que cria casinha de pássaro a arvorinha que cresce debaixo dos olhos do dono. Seu olhar segura afeição na gente!
Seu sentir descomparado, desenha manhãs na paisagem. E a inocência se encarrega de prolongar os domingos. Haja visto, pela falta que ele faz. Leonardo é quase uma saudade!


Pelo aniversário de um amigo por demais especial, uma alma distinta e cativante. Leonardo







A imagem é da Amanda Cass



terça-feira, 21 de setembro de 2010

Espero vocês por lá...

Oi minha gente,


Uma notícia legal!

Agora estarei nesse endereço aqui também ó: http://www.hierophant.com.br/arcano/posts/labyrinth... Me visitem. Este site também possui muitos outros assuntos e variedades interessantes. Mas eu estarei em "Labirinto de idéias... Agradeço ao pessoal do Hierophant,  Govardhana e Kamalaksi... 


E pra quem inda não me achou lá pelos quintais do Twitter: http://twitter.com/ziris_umapoezia





domingo, 19 de setembro de 2010

Beré brinca de poeta

ziris ziris ziris ziris ziris...

É o barulho que fazem as pernas do grilo...

É também o Quintana desfiando estrelas, bonito isso né?

...~... 

Bonita é a maneira como você me ouve!
Alminha boa...

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Tão longe e perto de tudo...



Um dia não pousa um pássaro no fio do poste, nenhum! Nem o resvalar das folhas das árvores, nem o velhinho que sempre passeia pela rua…
Só letras soltas desenhadas demorada e caprichadamente na face do papel empalidecido de espanto…

A imagem é de Amanda Cass

***~***

Do céu


O céu permanece intacto.
Já as nuvens... como passam...

E deste céu coração que Deus me deu,
Tenho eu,
Sido a nuvem.

Willyan Luemi




um poeta como não havia lido nos últimos tempos...










quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Terceiro dia





Ave Graças! Bendito anjo de asas degradê! Se ele não tivesse colocado a mão na frente na hora do soco eu estaria agora desfigurada... Ainda assim, tenho medo por mim e meu jeito desengonçado. Passei três dias tentando sentir raiva. Três noites engolindo o mal a seco. Deu-se que fiz força, espremi a palavra atravessada, saiu um riso. Valei-me, nasci para a distração. Quando dei por mim uma resenha de lembranças trajadas com folhas de urtiga, viraram a esquina sem olhar pra trás. E as boas, dirigiram-se à varanda, afim de acontecer de novo, papeando até a velhice delas. Tenho caçado jeito de choramingar as recordações part-idas mas as lágrimas emperram às portas dos olhos até secar. O criativo relógio na parede, contou setenta e duas horas torturando as tristezas nas mais doces palavras e até a última destas. E eu mal dou-me pelos dias que passaram, curioso isso! Meus nadas até a boca de vida. Afilado e cortês o fio que me separou de uma condição à outra. Cruzei a fronteira apenas num piscar, abrindo caminho com as mãos e um punhado de fé!

Ziris


...~...



"Perdoai. 
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem
usando borboletas."


Manoel de Barros


A imagem é de Amanda Cass 








domingo, 29 de agosto de 2010

Dos desapegos

Anoiteceu antes do meio-dia. Mas eu já precisava mesmo e mais que tudo, catalogar o atestado de óbito desta fase seca. Puxar o risco invisível que separa uma condição da outra. Não sei quanto tempo demorarei para voltar aqui com boas novas, para recuperar a menina saltitante que fora terrivelmente vilipendiada  por corações distraídos envoltos em corpos de dublês, dispostos a qualquer mentira fácil. Não sei quanto tempo demorarei para malograr essa substância deletéria e indigesta. Se eu resolver engolir, volto em três dias. É o tempo de uma ressurreição gente. Prometo. Porque tristeza é tristeza e só dura o tempo do momento. Vazio é vazio e a gente vai preenchendo.


Caio vive dizendo, 'Quis morrer de novo, engoli outra rejeição - mas estou vivo e, sinto muito, vou continuar.'  

Então... Nos vemos em outra vida.


Deixo aqui, um enredo espantosamente sensível de minha mentora literária, madrinha de parque, hermana espiritual, prima de roça, estrela Pipa, que consolou-me milagrosamente, por conta do sentir... E por isso, estou triste mas sou feliz!







quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Tempos longos esses...




Dia desses, passei a assinar meus bilhetes com uma bela carimbada do dedo polegar colorido de tinta, cada uma de uma cor, imaginando quem pudesse descobrir a verdade por trás do escrito.
Mas quem os encontrava primeiramente pensava -  e essa agora?!?!
Tempos longos esses... Meu gato quase aprendendo a falar ou eu a miar... No armário, comida por ordem alfabética. Uma fornada de biscoitos sorridentes no forno. Me pego atravessando o corredor de olhos fechados e julgo um feito chegar até o quarto sem dar nenhuma topada. Na quina da porta um Louva Deus gesticula sua admiração. É impressão ou as paredes avançaram vida adentro? Pra mostrar coragem eu saio, até o quintal, trepo no galho mais forte do abacateiro, e ensaio um vôo na sombra dos braços esticados. De cima é tudo tão maior... Um distinto inseto se apresenta ao nariz do cão. Cinco Beija-flores arruaçando, bem uns seis Bem-te-vis voando e um Canário na gaiola do Alemão. A joaninha caminhando nas pétalas no Girassol, quer conversa não. É impressão ou a vida espia tudo, com sombrancelhas absortas? O olhar vai entardecendo. As nuvens formando borrão. Pra botar a cama, capricho nas dobras do lençol. Hora de me deitar e o olhar levantar, coração palpita no portão...



quinta-feira, 29 de julho de 2010

Caminhos em branco


E eu sem mais sentir o aroma escuro da solidão. Dei de ombros, que fique. Deu-se que ela resolveu ir, desaforada. Me presto a carregar suas malas lotadas de capim seco. Seu vestido esvoaçando melancolias. Lamento não poder esperar que ela se apequenine no horizonte balançando seu lenço bordado de mágoas. Tenho meus passos atrasados em minha direção. E ainda estou à uma estação daqui. Um caminho sem marcas no chão. Não há mais o que chorar pelas folhas caídas, secas e amareladas, nada há nisso de triste, ainda que a tristeza pense que é. Foi só um vento rezador capinando tempos envergados. O outono com suas mãos ramosas desmanchando o presente. E eu revirando os rascunhos do futuro, como um arroubo de probabilidades armando sobre mim um bote certeiro. Tudo é apenas novíssima página em branco. E eu tomando a caneta por mim. Desvirando as palavras. E eu montando de volta em mim. Alforriando as asas... Há tanto grudadas junto ao corpo. E eu economizando tudo, menos a alma...







terça-feira, 20 de julho de 2010

Tempos de mar...







Olhos dos meus olhos, caminhos de meus pés, ressaca dos meus humores, força das minhas vontades… Corpo de marés que aquietam meu coração! Odoiá!
Que é pra quando não podemos lavar sozinhos, os nossos caminhos!





A linda imagem é da Renata e ela fica aqui ó: Renata – http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=16879465369204358824



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terça-feira, 6 de julho de 2010

Sobre quedas e vôos



O menino havia perdido o olhar de ave. Culpa de um estilingue que o acertara num de seus passeios e por isso fora cair bem longe do ninho. Logo depois fui eu. Que caí pra outro lado. Aqui no chão, tem dessas coisas, de estilingue, palavras de fogo e gaiolas. E o não admirar-se de uma revoada de fim de tarde. Coisas difíceis de conceber. O fato é que desde então ele anda por aí sustentando uma tipóia, com os olhos varrendo o chão e a cabecinha a pensar imediatices. Sem asas é difícil pensar alto. Eu sei disso porque também fui arrebatada e agonizo uma cicatriz bem grande na asa esquerda. Mas eu sou destra de nascença, ele sabe que eu poderia lhe fazer um curativo permanente se ele deixasse. Mas ele só passa aqui fugindo, deve ser porque ainda não sabe direito quem o acertou. E pra quem já foi capturado, agora toda gailola é trancada. Prefiro acreditar que a pedrada causou uma tonteira passageira, do que na queda ele tenha batido a cabeça e perdido a memória. Enquanto isso fico aqui a piar o desencontro, quem sabe ele ouve de longe e tem saudades...
Será que ele ainda sabe que para dois voarem juntos, duas asas já resolve? 







sábado, 3 de julho de 2010

Das entregas




Pela noite as paredes parecem estreitar e desafiam cada centímetro contrito meu a colher alguma descoberta. Respirar dói. Devastar segredos entre o imenso cor de sombra, é a minha pior agrura. Mas às portas de mim, uma gota ansiosa procura escôo pela minúscula fissura da possibilidade, e na lida chega às vias de derramar todo aguaceiro de dentro. Os dedos tremem. A barragem desaba. São linhas ondinas as minhas, que dançam uma canção de alívio, jorradas, libertas de todo o precipício de estar. E feito ventarolas pratedas pela lua, agora navegam calmas pelo oceano. Então posso estar contigo ou comigo ou em qualquer lugar. Uma pequena cissura, um bafejo e à face generosa do papel outrora em branco, ofereço a minha alma alí descansada...





sexta-feira, 18 de junho de 2010

O tio do sovete





Ó o sovete, sovete, sovete!
Era ouvir de longe, e lá estava eu e metade do bairro a procurar moedinhas pra comprar o tal sovete. Mas isso nem era a diversão, não!
Bom mesmo era ouvir as histórias que o tio contava enquanto dicascava um picolé para dar de pouquinho em pouquinho para os meus cachorros. Logan era fã do tio, nossa se era! E o tio fã dele também.
O dia que ele chegou e não viu o Logan no quintal, foi triste! “Mai, cadê  o cachorrão preto, faz dias que ele não me espera no portão…”, disse ele, já dicascando um picolé! Daí falei rápido: “ele se foi tio, ficou doente e se foi.” Quando percebi que o tio ia chorar, mudei de assunto, mas ele continuou: “Você tá triste né? Cachorro bom que ele era, cachorro bom”. Depois sabiamente  mudou de assunto e ainda com lágrimas nos olhos acompanhando um sorriso amarelo, disse que tinha novidade.
Me explicou todo cheio de palavras novas, que demorou pra subir a rua, porque estava agora a vender remédio natural. Para esmagrecer, para colesterol, pressão-alta e mais um bando de coisa. Disse, todo feliz, que iria ser promovido gerente assim que recrutasse três novos vendedores.
Foi aí que engoli seco. Já tinha ouvido essa história antes. Gente que engana gente de bem, prometendo mundos e fundos porque viu nos olhos do outro a inocência e a vontade de vencer na vida. E o tio é um desses homens, puro, de fibra, que anda o dia inteiro, vendendo o sovete mais gostoso de se tomar na rua mesmo, alí com ele . Pensei no porque tudo ficou tão difícil… O tio estava empenhado em vender o remédio, porque parava mais de uma hora com cada pessoa na rua, explicando os milagres que o remédio operava. Mas ele ainda  carregava o carrinho de sovete pra cima e pra baixo. Parecia até que dentro do carrinho ele estava levando esperança ao invés do sovete. O povo nem estava mais saindo pra comprar, por causa da falação do tio e porque queriam o sovete com histórias e só. Tão enganando ele, pensei, tão enganando ele! Fiquei aflita e sem saber o que dizer, só que não tava precisando do remédio.
De que forma eu poderia  dizer a ele pra tomar cuidado, sem arrancar de uma vez de dentro do seu carrinho, toda aquela esperança?
Então tomei o sovete ouvindo a história do remédio, e terminei aquela conversa dizendo para ele não se esqueçer nunca de passar na rua com o sovete mais conheçido e delicioso das redondesas. Disse que se ele continuasse vendendo, um dia poderia ter uma sorveteria! Nesse momento a fronte suada do tio mudou, seus olhos negros brilharam e ele sorriu: “É fia, Deus te ouça, e se Ele ouvir Ele faz, porque Ele é bom”. Entrei em casa rezando para Deus ter ouvido e tenho certeza que ouviu!
Deus é bom, mas o tio é bom demais, tio bom esse!