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Aqui a poesia é amadora. A música e a fotografia, amadoras. Tudo dentro deste peito é amador.

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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Poeira

Fotografia: L!P_RJ
José tinha tudo de seu dentro daquela casinhota. Tinha fogão de lenha, lençol com cheiro de limpo, passarinho nos galhos da goiabeira na beira da janela. Tinha Cícera de flor no cabelo. Tinha Cícera cosendo. Tinha Cícera pregando os botões da sua camisa. Tinha Cícera... Tinha os meninos seus e de Cícera correndo descalços, levantando poeira na estrada. Tinha cheiro de feijão de corda cozido. José tinha tudo. E trabalho duro na roça também. Ele não sabia mas comia batata com gosto de batata. E tinha Cícera de peito suspirado à sua espera. Tinha também na cabeça que achava difícil aquela vida no mato sem conhecer outra. Tinha também de voltar da lida todo dia pela estrada parando de armazém em armazém com o cachorro faísca acompanhando atrás. Tinha de ir engolindo cachaça com poeira e amargura para esquecer do que tinha. José... Coitada de Cícera e da vida no mato. José vivia mais era de ter que afogar peixe pro almoço... Todo dia.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Zulinhas

O progresso de um apelido para o nome de uma flor: Ziris - Ziris que gosta de azul, Zul-íris - Zuli - Zulinha. Pronto agora pode ler.


Hoje quando saí pra ir pro trabalho, passei pelas florzinhas, aquelas que lembram você, as da foto.
E de manhã, o céu estava chuviscado de cinza e o dia chuviscado de frio.
O que estranhei foi ver que elas estavam abraçadinhas em si, sabe?
Fechadinhas, feito casulinhos.
Mas, o sol resolveu dar as caras...e quando voltei pro almoço, passei por elas de novo, e elas estavam com todos os bracinhos de fora.
Achei tão bonitinho. Queria te contar.

Igual gira_s_sol.
Queria saber o nome dessa plantinha.
Porque por enquanto o nome delas são Zulinhas.
Acho que não me enganei, quando disse que se pareciam com você, até no nome.

Texto e fotografia: Lígia Maria Torres

 ~º~

Hoje o dia esta chuviscado de frio. De novo. Então eu finjo que tô no maior papo com a Lirinha, é assim que eu a chamo. Ela diz que quando a gente ama num tanto muito grande nem precisa falar que ama, inventa esses apelidinhos bonitos. Eu concordo. Numa época em que sobra falta por todos os lados eu sorrio e rio sozinha (como diz ela). Só agora percebi que ainda não havia sorrido hoje. As Zulinhas tem mais facilidade de asfalto que eu. Mas eu esforço. Elas nascem em qualquer lugar, eu desfaço em qualquer canto, mas rebroto com esses afagos. Como as Zulinhas com o afago do Sol. Sou tão feliz, mesmo quando chuvisca. Essa moça me escapóle azul pelo cantos dos olhos, azul só azul. E são tão bonitas nossas longas prosas, tão ternas que terminamos com ela dizendo: 'Ziris, mei gay essa conversa né? Vai dormir, tranca tudo e se cobre bem.' E a gente ri. E ri. E ri... Amizade é coisa de jardim mesmo.


Então eu me estico muito, viro no avesso, que é para abraçar direito a Lilis - a Liws - a Lirica - a Lilinha - a Lígia Maria Torres. (Mei gay, de fato)







terça-feira, 29 de novembro de 2011

Dicionário das substâncias



Alegria, se for de explicar, é quando Deus vem passar o domingo dentro da gente. 
A felicidade, quando Ele gostou da hospitalidade e resolve ficar pra sempre.


Se eu não desconfio, tenho certeza. Porque Deus a gente também vê pela janela.


Fotografia: Ziris

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Última carta de novembro

Tenho dedilhado rascunhos nas minhas paredes, mas não é fácil passar a distância a limpo. Pensar é longe e há essa palavra onde caibo inteira, mas me dissipa e não me recebe. Esta falta, que é uma letra onde minha caneta afundou.


Criei novas lembranças, que nos salvam de palavras mudas e as vestem como se assim eu pudesse aprisionar a tua memória que me escapa pelo canto dos olhos. Como vestem com teu cheiro meus lençóis exaustos e as manhãs em que não nos esbarramos. Você é o vulto amotinado na minha mentira de ver e levanta o olhar tão devagar, que eu só me deixo ir te suspirando pelas calçadas.

Eu não aprendi a dobrar uma saudade e acomodá-la em qualquer envelope pequeno demais. Porque talvez, saudade seja só estar longe.
Eu só espero uma notícia explícita como um desabafo. Uma, que se vier, me traga de volta.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Chão e ar


     E o gato abanando os olhos dizia: a gente tem é uma vida boa aqui no jardim, junto às coisas desprezadas...


Fotografia - Ziris 
Modelos - Rajado, que atualmente vive com sua noiva no quarteirão de cima e Arco-íris, sujeito que vive de entreter gatos e gentes.
 


segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A Lourdes

     Vim de encontro com a Dona Lou no caminho do ponto de ônibus pra casa. Vizinha tranquila e brincalhona de uns 65 anos, talvez. Pena eu não saber muito dela, até. - 'Zi! Que chuva menina, vem vamo junta!' - largou alto, driblando o peso das suas sacolas com um sorriso bonito.E aceitou que eu dividisse com ela o peso e o abrigo no meu guarda-chuva, redistribuindo entre as mãos as sacolas. Apesar de algumas rugas lhe enfeitarem a tez, delicadas pinceladas do tempo que inevitávelmente esmaece, sempre a entendi muito moça e valente.
     Enquanto os respingos das poças na rua brincavam com nossos calcanhares, meditou - 'Os jovens estão todos com essa carinha de cansados que você tá hoje!' - Fingi um sorriso conformado e contei -  'O mal do século é a solidão, ouvi por aí Dona Lou.' - 'É nada.' - e continuou me adivinhando - 'Não é de agora que é complicado fazer amigos viu? Só duvide de quem prende um carinho para contigo às portas dos lábios. Como esse que me dispensou agora. Acho que colecionam muito mais dos teus defeitos na ponta da língua. São as mesmas pessoas que criam pássaros nas gaiolas... Escondendo dos outros as suas cores de asas. Mas tem uma gente aí que fica feliz quando conhece outra de valor... Elas tão por aí, Zi. Então continua indo... Só vai...' - Então deixei-a no portão e precipitei um abraço que ela sorriu ainda mais largo e veio enorme e desengonçada pra cima de mim. Que apertado... O marido a esperava na ponta da escada. - 'Oh Lou, eta mulher! Por que não ligou pra eu ir te pegar?' - Dona Lourdes continou com sua voz vibrante... - 'Oraaa, eu vim com a Zi, batendo um papo, ajuda aqui ó!' - Continuei o passo mais entendida desses respeitos...

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Revoo

Cabem ainda quilômetros de passos por dentro desta sala que me retribui o silêncio. Tenho jorrado uma coragem à deriva e pingado abandono por dentro desde muito. Lágrimas atrasadas emperrando os sorrisos, que secaram às portas dos olhos sem momento propício em desabar. Das que tem força de mil quedas d'água e a altura de um mergulho demorado. No seco da língua a indiferença insossa que mastigo enjoada... ela me sorri amarelo. É preciso que eu desabotoe este peito para me revoar, como quem encosta ao ouvido uma concha solitária que conta histórias esquecidas. Preciso ouvir dentro deste silêncio para conseguir estar mais próxima em passo do meu próprio abraço. É que hoje eu preciso me ouvir, me escrever e saber de mim...

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Brancura do céu

Escrevo pessoas. E às pessoas. Nunca pude fugir disso. Sou apenas a moça atrás da história. Porque eu penso que pessoas são como borboletas e as suas grandes asas frágeis e coloridas. Precisei mais que entendê-las, precisei doá-las ao papel, como se fossem ainda mais, pássaros cruzando branco céu, somente para que mais tarde eu pudesse segurá-las sem ferir suas cores...

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Amarelas

Especialmente pelos últimos tempos, tem sido difícil respirar. Milhares de cores invadindo minhas narinas despreparadas e eu apenas me afogando nelas. Plantaram Ipês por todas as ruas do meu bairro. Todos os dias abro as janelas na certeza de que escanearei suas cores para sempre enquanto corro de braços abertos em direção à um futuro ainda sem rosto. Por dentro, um canteiro inteiro espera por isto. Mas as flores também demoram a repontar. Torço para que sejam amarelas. Não sei, talvez esta cor ainda me falte na alma. Ou me falte entender que ainda existam pessoas dispostas a plantar árvores de flores pelas ruas... E elas existem.
P.S. 1: O correr da vida embrulhou-me. Farei uma pausa maior que a habitual, mas volto.
P.S. 2: Especialmente neste post, ouvi Yellow no repeat. E sorrí.
P.S. 3: Enquanto isso dobrarei sonhos em flores para entregar-lhes muito em breve. Tudo vai dar pé...

Amor, 
Ziris


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Das odisséias


Algumas palavras gravitam minha órbita mental desde você. Por isso entendo de odisséias. Precisei me agarrar a uma delas para conseguir parar de rodar em volta de mim... É que tirei os pés do chão tão rápido quanto um foguete. E ainda é possível ver de longe as chamas que resultam na queima curiosa de combustível pela atmosfera. Ainda sem coordenadas. E olha que de astronautas eu entendo, eles que não entendem de mim.




Para Bernardo Oliveira, que um dia acreditou... À mim e à todos que ainda acreditam...

sábado, 20 de agosto de 2011

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E quando não mais sobrar um suspiro de entrelinha, que o tempo me guarde a última nota deste teclado mudo que sonha ser piano...

Botão

Já contei um dia sobre ficar dependurada de ponta cabeça por uma letra, de uma carta recebida e tão esperada. Mas nunca contei sobre fotografias...

Alí  parada, com o afortunado retrato nas mãos, deixei que aos poucos meus olhos deslumbrados abandonassem o ambiente estranho do momento.
Algumas crianças felizes posavam frente ao jardim de flores bem cuidadas de minha mãe, da nossa casinha tão pequena de paredes amarelas e janelas marrons, do carro antigo em sua pintura espelhada, o mimo de meu pai!
Eu não, não estava. Menos ainda registrando o momento, pode ser que eu corria pelo quintal, eu corria muito. Ou subia no pé de feijão andu a descarcar-lhe os grãos, fabricando meus brinquedos e lembranças para hoje. Será que num dia daqueles alguém contou até dez de olhos fechados e eu me escondi tão bem que nenhum amigo ainda conseguiu me encontrar? Ou foi o tempo com seu relógio, que num dia desses felizes, me fazia correr tanto que meus pés mal podiam tocar o chão?
Hoje entendo porque instintivamente não gosto de relógios. Gosto de retratos. Esse botão do tempo. Os relógios só servem para marcar a pressa, nos fazendo correr com vontade de ficar e na mais nostálgica das hipóteses, voltar! Eu voltei, alí parada. Meu era uma vez...
Perguntei a mim menininha, se podíamos relaxar o passo para nossa alma nos alcançar…

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Pois como as cartas, os poemas necessitam encontrar seu destino

Ando distância. Já não tenho pressa, tenho fome. Pois tens por dentro de mim este poder de reticência.
Eu, o poder de vírgula, quando estico este pequeno sonho por toda extensão de minhas asas e decolo. Tua imagem gravada em meus olhos entressonhados. Teu sorriso clandestino eternizado na película.
Desfolho teu olhar, como versos distraídos que ainda não os sei. Sem imaginar que encontrarei trovões por dentro deles. Então empurro teu olhar com o desejo do meu para salvar-me do abismo de te ver. Fui atingida. Visto vermelho em meio a paisagem branco e preto. Me sobra a rua e seu silêncio de árvores  e de um destino tão desalinhavado.
E se te fecho os olhos é para iludir um tanto essas tonturas. Pois sempre que o persigo, meus dedos voltam manchados de espera.

domingo, 24 de julho de 2011

Back to black

Eu não gosto deste post. Nem do tipo deste post. Nem do motivo. Porém eu não poderia deixar passar sem uma despedida, mesmo que ainda anestesiada.

Tarde de sábado, 23 de Julho de 2011, consulto a internet pela primeira vez no dia. Amy Winehouse morta? Vejo uma imagem dela do clip back to black e meu coração esvazia. Em cinco minutos toca meu telefone, é o Beré com uma voz de inverno - já ligou a TV hoje?
Ele sabe que não assisto televisão e então se adianta - Zi, a Amy cara, ela morreu.
Surpresa. Ambos surpresos. Sim, porque a amávamos e confiávamos nela. Queríamos ao menos. Sentíamo-nos até seguros de que um proximo disco viria. E que ela encontrasse garra em sua arte para superar sua fragilidade e sensibilidade excessiva. E muito provávelmente uma carência sentimental enorme. Não aconteceu. E não nos envergonhamos de ter perdido a "aposta" para seres de alma mal cheirosa, declamadores de 'eu sabia e já era de se esperar'. O fato é que ninguém sabia de nada e tudo poderia acontecer. Amy era só uma moça de 27 anos cara! Que por fora, somente por fora era um terremoto mas por dentro um passarinho de asas quebradas impedida do voô.
Me lembro da primeira vez que a ouvi e pensei: estamos salvos! Era essa a sensação. Talento indiscutível, timbre poderoso. Não fui vê-la em seus shows pelo Brasil. Arrependo-me muito. Mais ainda por ter ficado brava com ela tantas vezes. Pensava nela e me lembrava da Janis... Medo. Puro medo. Meu. Dela. Pela vida. As coisas não são fáceis aqui. Mas mesmo com tantos escandalos, ela era imbátivel. Porém não superou a ingestão do composto: alcool, drogas e coração partido. Sem julgamentos. Quem sabe uma reflexão. Mas não hoje. Não para mim. Estou triste.

24 de julho de 2011. Tarde de domingo. Acordo e a primeira frase lamentosa em que meu pensamento se agarra é - Ah, Amy, não...
Me despeço, porque ontem não pude. Simplesmente agi como se nada tivesse acontecido. Mais desejando que não fosse verdade mesmo. Eu não poderia me despedir sem antes acreditar. E como fã, alheia aos comentários pseudo-moralistas, eu a ouvirei, o dia todo. E provavelmente vou chorar.

Amy, vai em paz, sua doida! Loves.

domingo, 29 de maio de 2011

Estado de domingo


Estou como as folhas para o vento...
E a paz esta para o peito... Como os pássaros para o céu. 
A liberdade para as chaves como o silêncio para o bem-te-vi.
Os bosques estão para passos, como o escorregador para o bumbum das crianças...
O chapéu esta para a cabeça porque o vento não esta para pente!
O olhar para livro, como o a buzina para o vendedor de algodão doce.  
Hoje o parque é para domingo. Porque os patos estão para os miolos de pão.
E as pipas no céu passeiam cúmplices como o cão na coleira do idoso. 
É que a manhã esteve para o meu acordar como uma janela para uma casa...






      

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Bem querer

Não havia nenhum interesse. A combinação entre as letras e os sentimentos parecia desfocada do mundo real. Enquanto os olhos imaginavam a quentura das mãos e os sorrisos despretenciosos colados e alinhados em um beijo. Imaginação. Assim que tomei coragem persisti naquele pensamento imaturo e sem perspectiva racional.
Tarde demais. Desenhei a voz melodiosa, os dedos pulsando sobre o violão e uma música aninhando o carinho que já não podia ser camuflado por mais tempo. A combinação de borboletas aninhadas no estômago era imparcial diante das maritacas gritantes presentes ali, no buraco do peito. Um misto de inacabado, uma esperança fora do comum. Mesmo assim pedi silêncio, o alvoroço instalado no caos dos acontecimentos berrava uma alegria, dessas que não se esconde dos olhos. Engoli a sentença justa e proporcional de uma guerra que acabara de se instalar diante de minha súplica confusa e assustada.
O que mais poderia me acometer? Um sentimento moldado silenciosamente, o suspiro preso no travesseiro e o contentamento aprisionado por um sonho deserto, entre linhas e desassossego diurno de um amor planejado no outono.
E quem planejou? Se não o acaso escondido entre as páginas de um livro ou a conformidade com o drama. A sobrevivência parece fácil. Vista do lado de fora. O coração pede efeitos especiais, faz acrobacias, brinca de palhaço, se pinta de fácil. Mas o que penetra é lento. Veneno, sonífero e miserável aos olhos de quem não pode tocá-lo. Enquanto a porta se fecha nos detalhes. Vou embora sem me tornar o meu melhor personagem. Fiquei frágil, petrificada diante do seu carinho e tive a necessidade de me esconder. Dos percalços, dos destroços derrubados por mim. Ninguém assim tão de longe, me teve assim tão perto. Cabe aqui alguns sussurros, algumas pieguices e nenhum vestígio de sorte. Você nunca veio de verdade, mas já é metade dos meus silêncios. É, pareço estranha, porque invento tua voz. Fantasio palavras tuas, feito pensamento, telepatia, distorção, rima e violão.
Me conta tuas dores. O que tem por dentro dos teus olhos, além do mistério que me toma pelas mãos. Me leva para as tuas histórias, dentro dos teus rascunhos proibidos, das tuas idas e vindas. Me conta um segredo e pulsa comigo no ritmo da nossa futura canção. A mesma que inventei hoje pela manhã, aquela que você nunca tocou, mas resmugou sozinho soprando na imaginação do meu bem querer.




Daí eu disse à Juliana:
diacho, essa foi dentro,
 bem dentro. Só você me transcreveria. 
Tá acontecendo bem isso aí com
 essa (de queixo caído) que vos fala.
Disse ela: Então fica de presente, tá?!
 Pega pra você Zi, como se fosse tua história...
Eu: lindo refrão para um começo de história. 

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Como o horizonte para os pássaros


E então eu me pergunto: Qual é a guerra? Existem pelo menos algumas centenas de chances que se levantam todos os dias com o amanhecer e sem que ninguém ouça, elas tramam um jeito de nos agarrar pelos olhos. Então eu simplesmente não vou mais chorar. Porque enquanto meus dedos acarariciam a terra ou as gotas de chuva formam cirandas sobre as poças, a vida acontece de forma milagrosa, todo-sempre. O orvalho continua sua prosa com as pétalas todas as manhãs. O velhinho despreocupado com seu cão mais apressado passeiam pela rua. A mãe divide a comida com os filhos. Vejam, na última página do jornal, numa imagem pequenina, um bombeiro oferece água ao filhote de urso salvo do incêndio! O time que perdeu. A chuva de estrelas cadentes. O filho que não volta para casa. Justificar é a guerra. Tudo o que alguém não pode ser ou deveria ter sido nos devora e enrouquece. Porque olhar nos olhos é o mais íntimo que podemos chegar de alguém e aconteça o que acontecer, já sabemos. Já fomos tocados. O silêncio é a gente. Só que maior. Eu só sei isso, só sinto isso. A vida é a chance. Encontrar um culpado quando o que mais queremos, mais que tudo no mundo é estar de mãos dadas, assistindo o céu da varanda, com todos os defeitos que possamos ter, é a guerra. Esse silêncio que somente parece dizer não, é a guerra. Porque pela madrugada, sozinhos, algo dentro da gente ainda parece pedir um abraço!



Imagem feita pelo fotógrafo Terje Sorgjerd em suas 170 horas sobre a montanha El Tiede na Espanha.




'Quando o dedo aponta para o céu,
o idiota olha para o dedo.'

do filme: o fabuloso destino de Amelie Poulain



sábado, 23 de abril de 2011

Ponte invisível



Ontem, esbarrei com 'ele' por aí... Depois de tanto tempo era a primeira vez que eu o entendia. 
Afinal, ele nunca havia ido embora de mim. Partiu de si. Sem deixar um olhar que atestasse um passado, nenhum sonho sequer. Foi-se apenas. Verticalizado pela culpa. Olhar lambendo os sapatos... Talvez por isso, eu nunca descobri a quem entregar o meu adeus. Mas foi ontem, ao formarmos essa ponte de olhares que dá acesso ao dentro do outro, que por um cisco de momento ele pescou-se de volta. Bem dentro dos meus olhos estava a mais bela face dele. E então eu o reconheci. Ele havia voltado. Não para mim. Para si. Como um filho arrependido que retorna à casa, perdoado. Agora ele já podia pedalar livre pela vida, sem as 'rodinhas'. Entendemos isso. E creio eu, assim muito docemente. Podemos enfim, assistirmo-nos sumir pequeninos no horizonte da estrada um do outro, vagararosamente, até nos tornarmos uma delicada lembrança de um sonho que se realizou. Pois sonhos que se realizaram, cumpriram o avesso de ser apenas sonho, para ser qualquer coisa boa na lembrança. 
E como eu, sei que é assim que ele gostaria de ser lembrado ou esquecido. 




Põe delicadeza no que vai escrever e onde quer que me esqueças... Thiago Pethit






Inspirado em encontro real e  também no belíssimo texto de Carmem: http://cacafarias.blogspot.com/2011/04/poe-delicadeza-no-que-vai-escrever-e.html ~ a quem abraço sempre e dedico.


quarta-feira, 13 de abril de 2011

O retorno



Era eu entre aspas. Sugada pelo susto para dentro do mudo retrato... Recolhendo despedidas com os dedos.
Eram os minutos desmaiando sua lâmina afiada pelos meus pensamentos plantados em algum lugar no chão, fatiando a memória como se eu tropeçasse no pretérito de minhas anêmicas lembranças.
Era eu flutuando no ar feito partículas dissipadas sobre o instante...
Era meu coração recortado... Como se fosse apenas uma silhueta vazada por onde o vento cortava caminho. Era eu página virada. E os pingos de chuva franzindo a imagem pintada nas poças dos meus olhos. Era eu chutando sonhos esfumaçados que brotavam do asfalto quente...
Por dentro, o eco. O retumbar fugidio de quem viveu de palavras e as recebeu nunca, que perdeu o paradeiro de uma caneta seca de nada sentir e sentia enfim... Era a alegria tumultuada de quem sorri como uma borboleta que se entrega sem resistência ao abraço do vento, salva da neutralidade ou de qualquer sentimento rasurado.
Eram as palavras escapulindo afoitas do meu peito. Logo eu, a mulher mais fraca que já conheci, que espiava fantasmas escondida por dentro dos olhos, agora arrancando letras soltas do meu piano de contar. Era eu, aureolada pelo verbo que dependurava em linhas eternas as sensações de apenas um segundo. A visão, este conto contado pelos olhos. Foi demais para mim.
Pois há esta desmesurável chance em minha escrita. Esta contradição que rompe com flores o véu do silêncio.
Era eu sem mais temer a descontinuidade das coisas.
A cada palavra que se completava no papel, um pedaço que faltava, colava-se novamente ao coração.  




Quando a dor se aproxima
fazendo eu perder a calma
passo uma esponja de rima
nos ferimentos da alma.

O espetáculo não pode parar...


Cordel do fogo encantado

quarta-feira, 30 de março de 2011

Desfeita

Se é pecado pensar tristeza debaixo de uma pitangueira florida?
Pergunte ao passarinho que fez xixi nos meus pensamentos!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Rasante

Passo rápido, quase invisível... Inquieta, cheia de saudades remexidas aqui dentro. E é daqui, de vocês, de mim e de como sou com vocês! A vida pregou-me uma peça. Nada de mais não gente, coisa que logo eu avanço com meus cavalos. Então... vocês me esperam? Eu volto!