Vim de encontro com a Dona Lou no caminho do ponto de ônibus pra casa. Vizinha tranquila e brincalhona de uns 65 anos, talvez. Pena eu não saber muito dela, até. - 'Zi! Que chuva menina, vem vamo junta!' - largou alto, driblando o peso das suas sacolas com um sorriso bonito.E aceitou que eu dividisse com ela o peso e o abrigo no meu guarda-chuva, redistribuindo entre as mãos as sacolas. Apesar de algumas rugas lhe enfeitarem a tez, delicadas pinceladas do tempo que inevitávelmente esmaece, sempre a entendi muito moça e valente.
Enquanto os respingos das poças na rua brincavam com nossos calcanhares, meditou - 'Os jovens estão todos com essa carinha de cansados que você tá hoje!' - Fingi um sorriso conformado e contei - 'O mal do século é a solidão, ouvi por aí Dona Lou.' - 'É nada.' - e continuou me adivinhando - 'Não é de agora que é complicado fazer amigos viu? Só duvide de quem prende um carinho para contigo às portas dos lábios. Como esse que me dispensou agora. Acho que colecionam muito mais dos teus defeitos na ponta da língua. São as mesmas pessoas que criam pássaros nas gaiolas... Escondendo dos outros as suas cores de asas. Mas tem uma gente aí que fica feliz quando conhece outra de valor... Elas tão por aí, Zi. Então continua indo... Só vai...' - Então deixei-a no portão e precipitei um abraço que ela sorriu ainda mais largo e veio enorme e desengonçada pra cima de mim. Que apertado... O marido a esperava na ponta da escada. - 'Oh Lou, eta mulher! Por que não ligou pra eu ir te pegar?' - Dona Lourdes continou com sua voz vibrante... - 'Oraaa, eu vim com a Zi, batendo um papo, ajuda aqui ó!' - Continuei o passo mais entendida desses respeitos...