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Aqui a poesia é amadora. A música e a fotografia, amadoras. Tudo dentro deste peito é amador.

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terça-feira, 12 de junho de 2012

Gato Realista ( uma ode à razão)

Este vestido 'Dulcinéia Del Toboso' não me serve mais! As traças, que até o ano passado se alimentaram de lembranças, devem tê-lo roído, porque já não me lembro de mais nada e falta pano aqui.

- Você engordou! - soltou o gato, agora já com ares Sancho Pancianos e pálpebras a meio palmo.

- Vai ficar aí palpitando e me assistindo performar o maior Tango da história realizado dentro de um vestido ou vai me ajudar com o zíper?

Que seja! Preciso conseguir me mover ao menos dentro da roupa. Opto por calça jeans e sapato baixo, mesmo inquirida pela expressão fashionista do bichano. Só quero levar meus olhos pelos caminhos, faz um dia lindo para registros de amor. Me recuso a assumir que ouvi um risinho de gato! Sorriu aquele que é castrado, tsc... Saio pisando duro.

No meu mundo andar de mãos dadas era a melhor carona, e vi os casais passando. E colhi o som das boas conversas que iam ficando para trás, registradas no vento. Lembrei-me de um amigo me dizendo:

- Você ama o amor! - colhi aquela frase que do tempo se despregou.

Na parada para o almoço e um café, uma prosa com o senhor alinhado da mesa ao lado sobre os planos de volta pra casa, palpitei um presente romântico para sua "patroa", companheira de 37 anos a fio. Colhi aquele momento com cuidado. O amor é um estado, não uma sensação? Preferi disfarçar fuçando alguns discos na loja mais adiante, enquanto ouvia o finalzinho de "wonderful tonight". Quando anoitecer, a coisa vai agravar um pouco, é verdade. Pensei em sorvete de flocos e um bom filme, ou, algumas provocações entre mim e o ser contrastante a quem, às vezes, chamo de meu gato. Sorrio antecipadamente. Passou.

Abro a porta de casa e "Sancho" me recebe entrelaçando seus carinhos pelos meus tornozelos.

- Esta se desculpando, "Sancho"? Eu também lhe devo algumas desculpas pela indelicadeza de ainda mais cedo. Solidão é uma estação não uma sensação?

Sorvete para mim, requeijão pra ele. É o mínimo. Apanho um "Spielberg" e ele mostra os dentes eriçando a linha dorsal. Que exagero. Woody Allen. Ele vence.

- Não dói sabe? Já tentei me fazer alcançar, mas eu sou longe, "Sancho".
- Você viaja. Estais a ver moinhos de vento demais. E meu nome é Tobias, a propósito. - lembrou-me o gato, realista, piscando um olho só.



Fotografia | Ziris

2 comentários:

  1. Minha muito querida Guia Espiritual à Distância,

    Permita-me recitar um trecho de Fábio de Melo?

    "Recordo-me. A jabuticabeira florida era epifania de uma felicidade de época. Alegrias com cores de novembro. Chuvas torrenciais que nos peritiam prazeres delicados. Observar a metamorfose das flores em frutos era satisfação sem preço. A natureza costurada de regras consumava diante de nossos olhos o ditado bíblico, de que debaixo do céu há um tempo para cada coisa. Era o tempo alivnhavando os destinos das floradas, enquanto no silêncio do coração uma primavera fora de hora insistia em lançar pequenos brotos."

    Recitei-lhe estes versos, porque é assim que te penso. Vim colher um pouco do ar que tu respiras. Quer companhia? Por aqui está a faltar oxigênio.

    A noite caiu como uma adaga abrindo velhas chagas...

    Um abraço epifânico.

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  2. há algo do ser humano em cada gato.

    "o amor é um estado, não uma sensação" - e não é que é mesmo? ainda que depois das sete vidas, esta frase continuaria não a fazer sentido, mas a ser o sen[ti]do.

    beijinho!

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